domingo, 27 de março de 2011

30 ANOS DE MAÍRA


Minha filha fez 30 anos esta semana.
Pediu-me jogos de memória e o devedê do carnaval carioca. O devedê ainda não saiu, ela vai esperar.
Levei Mônica e Sarah, os jogos que ela pediu e um edredon das princesas. Ela gostou de tudo, do camarão no almoço também.
Alguém escreveu que as pessoas especiais guardam em suas mentes um mundo de belezas, só delas conhecido. E que podemos alcançá-lo com carinho, compreensão, parceria. São instantes preciosos, lampejos de intensa luz e emoção.
Tenho buscado a companhia de minha filha. Tenho procurado conhecer esse seu mundo de belezas.
Hoje, baixou um silêncio entre nós, durante a sobremesa. Então, ela se virou, abraçou e beijou várias vezes as faces de Mônica.
Eu vi esse precioso instante.

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Ah, e ela aprendeu a não dizer mais a idade.

sexta-feira, 18 de março de 2011

JOSÉ PAULO PAES


Á BENGALA


Contigo me faço
pastor do rebanho
de meus próprios passos.




Extraído de "Prosas seguidas de Odes mínimas", de José Paulo Paes, Cia das Letras, 1992, em 5a. reimpressão.

quinta-feira, 10 de março de 2011

CINZAS


Bem, tudo agora não passa de cinzas de celulóide queimado. Boicotaram a Unidos da Tijuca. As celebridades foram agraciadas em SP e RJ. Fica a lição: seja primeiro celebridade, depois tudo lhe cairá no colo. Inclusive a condição de escritor famoso e premiado.

Quando coisas assim emporcalham o ambiente - um livro péssimo que começo ler também causa o mesmo efeito - recorro a Guimarães Rosa para o necessário reequilíbrio sensorial. Retirei de "Tutaméia" algumas frases:

A flor é só flor. A alegria de Deus anda vestida de amarguras.

Enquanto isso, o tempo, como sempre, fingia que passava.

Foram felizes e infelizes, misturadamente.

Infelicidade é questão de prefixo.

[...] viver é um rasgar-se e remendar-se.

Fé é o que abre no habitual da gente uma invenção [...]

Loucos, a ponto de quererem juntas a liberdade e a felicidade.

Esperar é um à-toa muito ativo.

O mundo do rio não é o mundo da ponte.

A gente quer mas não consegue furtar no peso da vida.

Só o vilão sonha sem o seu coração.

Para mim mesmo, sou anônimo; o mais fundo de meus pensamentos não entende minhas palavras; só sabemos de nós mesmos com muita confusão.


terça-feira, 8 de março de 2011

BOICOTE À UNIDOS

A Todo-Poderosa, que tem detém a exclusividade na transmissão do desfile das escolas de samba, abriu as baterias do silêncio em prejuízo da Unidos da Tijuca.

Vi ontem no GloboNews uma entrevista com certo carnavalesco. Perguntaram a ele sobre as escolas da primeira noite, menos sobre a Unidos da Tijuca.

O estandarte de ouro foi para a União da Ilha que, coincidentemente, faz aniversário este ano, o do incêndio no barracão. E apenas a porta-bandeira da Unidos da Tijuca foi lembrada.

O carnavalesco da Unidos da Tijuca, Paulo Barros, construiu alegorias e fantasias adequadas ao enredo da escola. Explorou mais uma vez sua sacada do ilusionismo. Só ele pode fazer isso na avenida, nenhum outro carnavalesco terá coragem de plagiá-lo. Portanto, pau nele, pau na escola, pau no desfile.

Pode até ser que amanhã, abertos os envelopes, a Unidos da Tijuca ganhe o bicampeonato. Mas duvido, depois do que tenho visto no noiticiário da Todo-Poderosa. Vou torcer para que os jurados, que aplaudiram de pé a comissão de frente da Unidos da Tijuca, façam a coisa certa.

O tradicionalismo dos desfiles está sendo bombardeado pela inventiva do Paulo Barros. Fico com a criatividade.

domingo, 6 de março de 2011

UNIDOS DA TIJUCA, BICAMPEÃ



O desfile da Unidos da Tijuca não terminou e eu digo "é campeã!"

Vi até agora a comissão de frente e o carro abre-alas.

Perfeitos, magistrais, únicos.

Uma comentarista da Toda-Poderosa diz que o desfile repete o ano passado. A moça fala "xis" e é "Da Lata", não sabe o que vê. Papo de portelense, de mangueirense, de quem se vê, de repente, conservadora.

A Unidos da Tijuca não repete o desfile campeão do ano passado: vai fundo no veio que a levou ao título, o do ilusionismo, da coreografia, da surpresa.

A comissão de frente executa dois truques: o da cabeça que despenca e o do corpo partido ao meio. E a barca de Caronte é simplesmente fantástica.

E o enredo diz: Tá com medo de quê? O filme já vai começar!"

Simplificando: a Unidos da Tijuca traz o carnaval para a contemporaneidade. Simples, assim.

Que façam melhor!

PS... tentei botar aqui a foto do carro dedicado ao filme "Avatar" e ela foi parar lá em cima. Deixa estar, é um verdadeiro espetáculo. Já ganhou, gritou a arquibancada.



Imagem: globo.com.br

sábado, 5 de março de 2011

LEITURAS PRÉ-CARNAVAL 2




Antes do livro de memórias do palestino-norte-americano Ed Said, li o livro de contos do indiano Aravind Adiga, "Entre assassinatos", publicado aqui pela Nova Fronteira. Adiga é o autor do premiado romance "O tigre branco".

Alguns livros têm sido publicados com classificação ambígua, nem romance nem contos, ou ambos, ou nenhum dos dois talvez. Lembro agora de "eles eram muitos cavalos", do Luiz Ruffato, que reuniu um sem número de micronarrativas paulistanas apresentadas pela editora como romance, pois São Paulo seria o personagem central de todas as narrativas. Ruffato, meio constrangido, confessou- me certa feita não estar seguro quanto a isso e deixou o traque na mão da editora. Compreendo. Pois tenho inédito também um livro de contos onde meu lugar natal, o Brundué, poderia ser considerado o personagem central da trama contística. Mas, cá pra nós todos, eu não tenho o atrevimento de publicá-lo como romance. Ou teria?

Bem, "Entre assassinatos" é indicado como romance indiano na ficha catalográfica. Que seja. Mas são 14 contos ambientados na cidade portuária de Kittur, território ficcional, nos quais Adinga apresenta com crueza e alto grau de realismo a odisseia dos miseráveis. O personagem central seria Kittur, ou a Ìndia hodierna. Corrupção, violência,preconceito entre castas, convivência multi-étnica nem sempre pacífica, conflitos religiosos, o desespero comum aos países em desenvolvimento. Os contos poderiam ser ambientados em Salvador, Recife, Rio ou até mesmo Porto Alegre. Miséria é miséria em qualquer parte, já cantou Titãs. Corrupção e sexo, também.

O título reporta ao período, na década de 1980, entre o assassinato de Indira Ghandi e de Rajiv Gandi. Não vi importância nisso, não sou historiador ou cientista político, pouco importa às narrativas se lidas como literatura, o que fiz. Ou seja, o título não valoriza o livro. Linguagem jornalística, direta, desprovida de poesia, muito apreciada pelos críticos contemporâneos. Eu, que sou jornalista de formação, não vejo muito valor nisso. "Entre assassinatos" paineliza a vida sofrida na Índia atual, um mosaico de dor e canalhice e algum sonho. Dois ou três contos, aqueles com finais polissêmicos, por assim dizer, merecem uma segunda leitura.

Como não sou crítico, digo apenas que me moveria com bem mais rapidez para comprar um novo livro de Alessandro Baricco, de Chris Offut ou Junot Diaz, que de Adiga. Digo muito, assim, espero.


Imagem: Blog Imagens, Adiga com o primeiro romance nas mãos.

sexta-feira, 4 de março de 2011

LEITURAS PRÉ-CARNAVAL


  1. Ando, como sempre, aferrado a livros. Concluí hoje a leitura de "Fora de lugar", de Edward Said, um nome por demais conhecido como crítico literário e ensaísta, morto em 2003. Palestino de nascimento, cidadão norte-americano por ascendência paterna adquirida, criado no Egito, cristão protestante, Said sempre se considerou fora do lugar. O livro tem como subtítulo "Memórias". E o que faz: escrafuncha sua infância, seu relacionamento com os pais, o casulo politicamente alienante em que foi criado, a inseguranaça adquirada, os ambientes escolares, as poucas amizades, as hesitações quanto ao estudo, a sexualidade reprimida, a dependência familiar. Leitura irresístivel, que atravessei em pouco tempo.
  2. Em muitos momentos, senti-me incomodado na leitura de "Fora do lugar". Simples: Said nasceu e foi criado em ambiente de alta burguesia, nada lhe faltando de material, viajando sempre, e muito, sempre de primeira classe, frequentando as melhores escolas, tudo de mais confortável. Aí eu me questionava sobre a importância que tal leitura tinha para mim. Tá bem, o Said tornou-se depois, bem depois, a partir de 1967, quando tinha 34 anos de idade, um intelectual orgânico, engajado na "luta do povo palestino", com todas as implicações que o tema traduz. Continuei incomodado.
  3. Não conheço a obra teórica do Ed Said. Mas li suas memórias em poucas sentadas. É um bom livro, até mesmo pelas curiosidades que revela, como por exemplo, dois tapas que levou de um certo Michel Sauloub (escrevo de memória), líder estudantil da escola inglesa que frequentava no Cairo, por uns gracejos públicos que o ofenderam. O tal Sauloub tornou-se conhecido mundialmente, mais tarde, como Omar Sharif. Coisas assim.
  4. O livro acaba abruptamennte, talvez por conta do estado avançado da leucemia que acometeu o Said em 1994. Prometo um trecho de "Fora do lugar" em outro post. Sua leitura lembrou-me muito o "Istambul", de Oran Parmuk. Bom, mais isso é outra mesma história, que fica pra depois.