sexta-feira, 4 de outubro de 2019

SÃO FRANCISCO: O SANTO, O RIO E O GÊNIO

 


    O rio é chamado de São Francisco porque sua foz foi encontrada pela expedição portuguesa que fazia o reconhecimento do litoral da nova terra, a mando d'El Rei de Portugal, no dia consagrado ao santo dos pobres. Américo Vespúcio era o cartógrafo, foi quem anotou lá a existência do grande rio, naquele 04 de outubro de 1501. 
       
    De lá até os dias que sofremos na pele, o rio São Francisco foi o Rio dos Currais por todo o período colonial e o rio da Integração Nacional já na República, quando os vapores navegavam entre Juazeiro e Pirapora. Atualmente, entulhado em vários trechos, já não serve à navegação, mas como reserva para geração de energia elétrica e irrigação das grandes lavouras. Sem falar no sangramento a que o submetem para abastecer os tais canais... bem, deixemos isso de lado. 

   Quero lembrar aqui algo que relatei no romance "Beira de rio, correnteza", páginas 134/6:

   Naquele mesmo porto, chamado de Boca da Barra, pouco mais de cem anos antes, um diplomata inglês em serviço no Brasil, Richard Francis Burton, Sir, desembarcava no começo de um dia ensolarado. Era um preciso e festejado dia Quatro de Outubro, aniversário de achamento do rio e data comemorativa do santo que o nomeia, coincidência que merece particular e futura apreciação.

   [...] Burton era figura ímpar. Geógrafo, cartógrafo, explorador, linguista, escritor, tradutor, diplomata e espião da Rainha da Inglaterra. Um renascentista e viajante inveterado. Em Bom Jardim, ocupou-se parte do dia em andanças pelo arraial e arredores, em conversações com o povo e a fazer anotações, fato em nada espantoso pois Burton dominava a língua, tendo passado temporada em Goa, então possessão portuguesa na Índia. Adotava como prática a imersão na cultura do povo que visitava. Comia de sua comida, bebia de sua bebida.

    As anotações que fez em Bom Jardim, nos idos de 1860, Burton reuniu no livro que publicou sob o título "Viagem de canoa de Sabará ao Atlântico", editado no Brasil pela Editora Itatiaia. Resumi no romance os registros mais importantes que Burton fez sobre Bom Jardim, nossa Ibotirama, quando ali passou um dia inteiro, o dia 04 de outubro, um dia como o de hoje. À noite daquele dia, Burton desceu até a altura do Barro Alto, onde acampou e promoveu batuques e farra com os nativos, sujeito sábio. Disse muita coisa sobre a carnaúba e sobre cada lugar que lhe mereceu passagem e atenção. 

    Mas de tudo ficou aquele 04 de Outubro, dia do Santo, dia do Rio, dia em que o genial inglês, primeiro tradutor para o ocidente das "Mil e uma noites", o homem que conduziu a expedição em busca da nascente do rio Nilo (vejam o filme "Nas montanhas da lua"), esse incrível cientista nos visitou e tão bons augúrios fez ao nosso futuro. Que se cumpram, e que não seja tarde para nós e para o rio.