domingo, 27 de fevereiro de 2011

O ROMANCE, POR RUBENS FIGUEIREDO

Um romance tem grande chance de se tornar irrelevante se não fizer valer seu poder de conhecer e de investigar o mundo histórico. Nas últimas décadas, boa parte da literatura mundial apostou na ideia de que só é possível ser crítico a sério concentrando-se na exploração da linguagem mesma, da construção em si. O legado de todo esse esforço me parece hoje decepcionante. Em vez de radicalidade, o que me parece prevalecer é uma falta de vitalidade, um acanhamento. Talvez seja exagero, mas hoje às vezes até pressinto nessa opção uma forma insidiosa de autocensura, ou no mínimo de conformismo. Não necessariamente por uma opção consciente do autor. A rigor, formou-se em nosso tempo um ambiente em que nem precisamos de fato optar: a escolha principal já está dada de antemão, não pode ser de outro modo [...].



Trecho de entrevista concedida pelo escritor Rubens Figueiredo (As palavras secretas, Contos de Pedro, Barco a seco, Passageiro do fim do dia) ao jornal de literatura Rascunho, edição de fevereiro 2011.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

E O BARQUINHO SEMPRE VAI





Todo abismo é navegável a barquinhos de papel.



Hoje me esparramei em "Tutaméia", de J. G. Rosa, de onde tirei a frase acima (do conto Desenredo). São 40 narrativas e 4 prefácios. Um livro que pede mais de uma leitura, a respeitar-se a epígrafe de Schopenhauer, cravada acima do sumário pelo autor. "Tutaméia", considerado um livro dificilímo, é um mundo de maravilhas, repleto de estrelas a sondar, rio de pescaria profunda, "painel de doces mistérios", citando-me.


Imagem: Bol Imagens

sábado, 19 de fevereiro de 2011

ESTRANHAMENTOS, POR MILENA BRITO


Em Estranhamentos [...] Mônica Menezes nos coloca diante de um eu lírico romântico, sensível, que utiliza a memória como "lugar" de encontro, expondo seu sentir e compartilhando suas surpresas, suas dores, tristezas, amores, e oferecendo sempre um certo espanto, ou "estranhamento" [...] ora concisa, ora farta, com a relação entre sentimento e poesia, deixando-nos um rastro forte de memória - quase nossa de tanto que é íntima [...] E oferece ainda uma marca feminina aguda, explorando todos os espaços de ser um sujeito poético feminino [...].




Excerto de resenha escrita por Milena Brito, professora do Instituto de Letras da UFBA, publicada hoje, 19.02, no Caderno 2 de A Tarde, sobre os livros de poemas de Mônica Menezes, "Estranhamentos", e de Nílson Galvão, "Caixa Preta", que integram a coleção Cartas Bahianas, da editora P55.

Imagem: Bol Imagens

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

W. H. AUDEN



[...] Deveriam haver monumentos e odes
aos heróis desconhecidos que começaram,

a quem arrancou as primeiras faíscas
da pederneira e esqueceu o jantar,


ao primeiro coleccionador de conchas
que ficou celibatário.

Se não fossem eles, onde estaríamos?
Ainda ferozes, sem hábitos caseiros,

errando através das florestas,
com nomes sem consoantes,


escravos da Dama gentil, sem
noções de civilidade

e hoje à tarde, para esta morte,
não haveria agentes funerários.



Trecho final do terceiro 'movimento' do poema "Hora cronicae", intitulado "Sexta", capturado no volume "O massacre dos inocentes - uma antologia", de W. H. Auden, em tradução portuguesa de José Alberto Oliveira, publicado pela Assírio & Alvim, em 1994.


Imagem: Bol Imagens