Antes do livro de memórias do palestino-norte-americano Ed Said, li o livro de contos do indiano Aravind Adiga, "Entre assassinatos", publicado aqui pela Nova Fronteira. Adiga é o autor do premiado romance "O tigre branco".
Alguns livros têm sido publicados com classificação ambígua, nem romance nem contos, ou ambos, ou nenhum dos dois talvez. Lembro agora de "eles eram muitos cavalos", do Luiz Ruffato, que reuniu um sem número de micronarrativas paulistanas apresentadas pela editora como romance, pois São Paulo seria o personagem central de todas as narrativas. Ruffato, meio constrangido, confessou- me certa feita não estar seguro quanto a isso e deixou o traque na mão da editora. Compreendo. Pois tenho inédito também um livro de contos onde meu lugar natal, o Brundué, poderia ser considerado o personagem central da trama contística. Mas, cá pra nós todos, eu não tenho o atrevimento de publicá-lo como romance. Ou teria?
Bem, "Entre assassinatos" é indicado como romance indiano na ficha catalográfica. Que seja. Mas são 14 contos ambientados na cidade portuária de Kittur, território ficcional, nos quais Adinga apresenta com crueza e alto grau de realismo a odisseia dos miseráveis. O personagem central seria Kittur, ou a Ìndia hodierna. Corrupção, violência,preconceito entre castas, convivência multi-étnica nem sempre pacífica, conflitos religiosos, o desespero comum aos países em desenvolvimento. Os contos poderiam ser ambientados em Salvador, Recife, Rio ou até mesmo Porto Alegre. Miséria é miséria em qualquer parte, já cantou Titãs. Corrupção e sexo, também.
O título reporta ao período, na década de 1980, entre o assassinato de Indira Ghandi e de Rajiv Gandi. Não vi importância nisso, não sou historiador ou cientista político, pouco importa às narrativas se lidas como literatura, o que fiz. Ou seja, o título não valoriza o livro. Linguagem jornalística, direta, desprovida de poesia, muito apreciada pelos críticos contemporâneos. Eu, que sou jornalista de formação, não vejo muito valor nisso. "Entre assassinatos" paineliza a vida sofrida na Índia atual, um mosaico de dor e canalhice e algum sonho. Dois ou três contos, aqueles com finais polissêmicos, por assim dizer, merecem uma segunda leitura.
Como não sou crítico, digo apenas que me moveria com bem mais rapidez para comprar um novo livro de Alessandro Baricco, de Chris Offut ou Junot Diaz, que de Adiga. Digo muito, assim, espero.
Imagem: Blog Imagens, Adiga com o primeiro romance nas mãos.
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