Guardar num dedo a memória de uma mulher. Voltar a essa mulher, aprendiz de gueixa em uma estância termal no País das Neves, noutro inverno, como se construísse a cada passo um poema amoroso. Kawabata conheceu certa gueixa chamada Komako e a fez borboleta nesse intenso romance de neve e fogo. Komako flutua em volta de Shimamura, e de outros clientes, envolta em quimonos alados; o pano de baixo é vermelho, por inevitável. Komako vai quando quer ficar; fica, quando quer partir; canta, quando doi; silencia, quando feliz. Nada se realiza por completo na narrativa. O desejo move essas personagens, mas escapa como floco de neve numa poça d’água. A solução, partir; mas retornar à hospedaria faz mais sentido para Shimamura, que em sua cidade deixou mulher e filhos. A neve a se acumular nos beirais como improváveis peônias brancas.
O texto de Kawabata explora o cenário de forma apaixonada, faz o mesmo com o cortejar mútuo entre Komako e Shimamura, até revelar a tragédia que pontuou desde o início esse idílio. A tecnologia macula o cenário com fogo e a Via-Láctea invade o coração de Shimamura para dizer-lhe que a loucura talvez seja o que verdadeiramente dá sentido à vida.
O país das neves, Yasunari Kawabata, tradução de Neide Hissae Nagae, Estação Liberdade, 2004. Publicado originalmente na revista eletrônica Verbo21.
Que coisa mais linda.
ResponderExcluir