domingo, 13 de maio de 2018

NO CAMINHO DOS SESSENTA IV


Ela de mim tomou conta
ali pelos meus dezessete.
Parece conto de onça,
causo de sete vez sete:
quando a pontada senti,
labutava num jardim,
pensei: é só um teste.

Tanto perfume sentia,
vivia a embriaguez
de amor e de poesia;
cada noite por sua vez
tanto prazer reunia,
que meu peito aquecido
quase nada percebia

Isso que a danada me fez,
quieta e mansamente,
consumiu lentamente
minha doce altivez,
retorceu a minha mente
entre ofícios e versos,
tornou-me doente de vez.

Aprendi então aos poucos
que se pode viver assim:
de dia, fugir do pipoco,
de noite, estourar festim;
de tarde, amar sem troco;
a noite pelo dia trocar,
pra de tarde amar de novo

De mim ela tomou conta,
pois conta não faço dela,
quando amigos me cercam
de amizade sem cancela,
a vida parece azulada,
uma vereda sombreada,
arroz doce na tigela.

Chego  aos sessenta assim
como quem sai dos vinte: 
irresponsavelmente sério,
hilariamente chatin',
preocupadamente sonso,
surdo, broco e manco,
crônico mas longe do fim. 


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