sábado, 28 de dezembro de 2019

2020


   Quase não tem graça alguma.
   Na verdade, cansa festejar o que não tem sido bom.
   E cansa, mais ainda, fingir esperança num novo tempo, que tudo tem para ser ainda pior do que este que se esvai. Esvai, mesmo.
   O bom de tudo que tem passado é que estamos aqui para escrever estas.
   E para ler estas e outras.
   Mas estou certo de que há quem discorde de que mesmo isso seja bom.
   
   Esperança, otimismo, fé no novo tempo...  -  pronto, cumprido o ritual.
   
   Fato é que perdemos muito mais do que é mantido.
   Notem que eu não escrevi "mais do que se ganha".
   Cada dia vivido, uma perda no saldo.
   Cada sonho adiado ou não realizado, ah... um estrago na alma.
   Cada oportunidade desperdiçada, um atraso de vida.
   Cada frustração sofrida, uma cicatriz.
   Cada amigo que se vai, o mundo reduzido.
   Cada topada, uma dor feladaputa a suportar.
   
   Ao positivar as orações acima, não se obtém grande coisa.
   Experimente, mas à vera. 
   Agora, se é para fazer parte da Grande Alegria das selfies e stories, então a coisa é farta.
   Tome Noronha, Seychelles, Times Square, Muralha da China, Torre Eiffel, praia de Copacabana...
   E depois do clique, a depressão.

   Ah, sim, somos inteiramente responsáveis por esse quadro deprimente.
   Como indivíduos, grupos sociais e sociedade inteira.
   Existir, resistir, pois.
   De alguma forma, preparar o couro para mais uma travessia.
   Não de um rio, mas de uma vala de lama fétida e tóxica de mais uma barragem rompida.
   
   Dizem que é um novo ano, dizem.
   Mas é bom preparar o couro.
   

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