quinta-feira, 22 de julho de 2010

2666



2666 matou Bolaño. E quase me matou também. Tive que ler sentado à mesa, durante um período excessivo e inédito para mim. Saí da leitura alquebrado e dolorido. Mas valeu a pena. A edição que li não foi, obviamente, a da foto acima, mas parecia igualmente carregar todo o peso do mundo. Cinco livros enfeixados em um, quase 900 páginas, um tempo que atravessa quase todo século passado. Tudo que um grande romance deve ser, 2666 é. E isso parece-me suficiente.
Bolaño deixou recomendação para que os cinco livros fossem publicados individualmente. Os editores fizeram diferente, e fizeram bem. "A parte de Fate" não teria o valor que tem se publicado isoladamente, por exemplo. "A parte de Amalfitano, também", e assim por diante até o fim. Parece que a motivação principal de Bolaño seria financeira etc.
Prefiro deixar aqui um trecho:
"Que triste paradoxo, pensou Amalfitano. Nem mais os farmacêuticos ilustrados se atrevem a grandes obras, imperfeitas, torrenciais, as que abrem caminho no desconhecido. Escolhem os exercícios perfeitos dos grandes mestres. Ou o que dá na mesma: querem ver os grandes mestres em sessões de treino de esgrima, mas não querem saber dos combates de verdade, nos quais os grandes mestres lutam contra aquilo, esse aquilo que atemoriza a todos nós, esse aquilo que acovarda e põe na defensiva, e há sangue e ferimentos e fetidez."
Admiro as novelas dos grandes mestres, mas meu caro Bolaño, adorei mergulhar no imenso universo de horror e tédio do seu grande combate, aquele que o exauriu, 2666. Parece que o protagonista preferia também os grandes combates, esses em que havia "sangue e ferimentos e fetidez". Afinal, foram mais de 200 mulheres assassinadas...


Imagem: www.flickr.com, por Alice E. Oreilly

2 comentários:

  1. Estou a atravessar este mar de histórias, que é o universo de 2666, ainda estou a passear pela seara dos poetas archiboldianos, mas ja sei que ondas mais altas virão!Um grande abraço e bom ter descoberto este canto aqui!!

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  2. Eu sou fã de Bolaño e fã de grandes romances (romances volumosos), mas o que prefiro dele é um conto que está em Putas assassinas, um conto inesquecível. Que coisa estranha, não é?

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