segunda-feira, 9 de novembro de 2015

HUMANOS NO MEIO DA TARDE


   A carga era muito alta. A lenha se apinhava na carroceria de forma desigual. O caminhão balançava na pista. Seguia à nossa frente a uma velocidade que nos parecia inadequada para aquele estropício. A rodovia, no meio da tarde de um domingo, não apresentava o costumeiro e ensandecido movimento. A 101 tranquila.
   Entre nosso carro e o caminhão trotava um Fiat Uno do século passado. Então veio a curva, aberta e plana, sem maiores dificuldades. Mas foi ali que o poeirão subiu na lateral da pista. Ao meu lado, M gritou:
   - Meu Deus, Carlos, uma batida, o caminhão virou!
   O Uno sumiu na poeira, eu puxei meu carro para o meio da pista, tentando contornar o que não via bem, temendo bater em algo que tivesse se soltado do acidente, aproveitando a ausência de trânsito no sentido contrário, e assim venci aquele pequeno trecho em perturbação. Vi as rodas do caminhão para cima, girando velozmente, e a carroceria meio esmagada contra o capim do acostamento. Parei meu carro logo depois do Fiat Uno. Outros carros começaram a parar nos dois lados da rodovia.
   Não houve batida, o caminhão havia tombado, muito provavelmente por conta do empuxo da carga na curva. O motorista do Uno confirmava que o caminhão vinha dançando na pista. E assim nos aproximamos da cabine e das pessoas que estavam lá dentro.
   Com o celular na mão, não consegui me lembrar do número do Samu ou da Polícia. M ficara no carro. Uma ambulância de atendimento intensivo havia parado e o condutor já estava ao celular falando com os socorristas e passando a localização do acidente. Parecia saber bem o que fazer naquela situação. O homem contornou a cabine e abriu a outra porta.
   - Duas vítimas, desacordadas, é, duas vítimas.
   E balançou negativamente a cabeça. Eu guardei meu celular no bolso e não me aproximei mais. M me chamava; havia saído do carro e me chamava. Troquei duas palavras com o condutor do Fiat Uno e voltei pro meu carro. Nada mais a fazer ali. 
   Do outro lado da pista, motoristas desciam dos seus carros com celulares nas mãos. E fotografavam sem cessar, de vários ângulos, o caminhão tombado. Não quisemos mais ver aquilo.
   Fizemos orações, em silêncio, por todos eles.

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