sexta-feira, 29 de março de 2013

CRISTOS (JOVENS) CRUCIFICADOS


[...]
somos (cristos) jovens crucificados
sentados à mesa posta ao ponto exato
das exigências da etiqueta
dos protetores olhares, das canecas de prata
das mãos calejadas, dos brancos cabelos
das falas agoniadas
jovens e crucificados
nos acomodando aos pregos das cadeiras
aos cabos dos talheres

somos (cristos) jovens crucificados
na bebida espumante e nos risos soltos
nos bares de fumaça e calções
na saliva fácil das línguas expostas
olhando sem alvo fixo nem pensado, aguardando

somos (cristos) jovens crucificados
quandos nos fitamos
quando queremos
quando não podemos, sempre

cristos, jovens, crucificados
inesquecíveis



Lembro hoje, sexta-feira santa, esse poema de juventude que incluí em meu livrinho "Água de cacimba", de 1998. Escrito em meus dezoito, dezenove anos, quando o Brasil vivia ainda o período duro, em Geisel, da ditadura militar. Houve um tempo em que ser jovem era "não poder". Contemporaneamente, ser jovem é possuir todo o poder. Não se sentam mais à mesa e passam longe da cruz, onde fincaram os pais. Serão inesquecíveis?

4 comentários:

  1. Carlos, você ainda tem algum exemplar de "Água de cacimba" para vender? Se não, fico no aguardo do seu novo livro de poemas. Abraço.

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  2. M. e Aeronauta, textos de juventude possuem um expressivo poder de sedução: corajosos, verdadeiros, históricos. E nos lembram quem fomos e o trajeto ao que somos. Vocês são generosas, amáveis, grato por tudo. E Lidi, não, não tenho mais exemplares de "Água de cacimba", mas em "Matalotagem", sua segunda parte, "Poesia anterior", é composta por uma seleta de "Água de cacimba". Abr. (carlos barbosa)

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