sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

A MENINA COM A LAGARTIXA, BERNARD SCHLINK

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A menina vestia uma saia vermelho-escura e, sobre uma blusa amarelo-clara, uma peça amarelo-escura, semelhante a um corpete atado folgadamente às costas. Grande parte de sua roupa e de seu corpo estava oculta pelo rochedo sobre o qual a menina deitava seus braços pequenos e arredondados e apoiava seu queixo. Ela poderia ter uns oito anos. O rosto era um rosto de criança. Mas o olhar, os lábios cheios, os cabelos que se encaracolavam à testa, caindo sobre as costas e os ombros, não eram infantis, mas sim femininos. A sombra que os cabelos jogavam sobre as bochechas e as têmporas era um mistério, e a escuridão da manga afofada, dentro da qual sumia o braço nu, uma tentação. O mar, que se estendia atrás do rochedo e de uma faixa estreita de areia até o horizonte, lançava ondas pesadas à praia, e através das nuvens escuras a luz do sol irrompia fazendo com que uma parte do mar brilhasse e o rosto e os braços da menina resplandecessem. A natureza transpirava paixão.


     O parágrafo acima descreve o quadro que dá título a essa novela de Bernard Schlink, publicada isoladamente aqui no Brasil pela Record, em 2010, com tradução de Marcelo Backes. Originalmente, "A menina com a lagartixa" integrou o livro de narrativas curtas intitulado "Liebesfluchten", que saiu na Alemanha em 2000, de onde foi extraída também a novela "O outro".
     A novela "A menina com a lagartixa" traz a relação amorosa de um garoto com um quadro, ou com a menina do quadro, descrita acima. Desde cedo, o garoto aprecia o quadro no escritório do pai, um juiz de direito que depois se torna vendedor de seguros e alcoólatra. Com a morte do pai, o agora estudante de Direito herda o quadro, que assume lugar na parede acima da cama em seu quarto. A existência do quadro é cercada de mistério quanto a seu autor e sua origem na família. Em busca de respostas, o protagonista mergulha no passado de sua família próxima e nos horrores da Segunda Guerra. 
     Schlink conduz a narrativa com leveza. Mas nada pode ser leve em almas presas a mistérios. Passo a passo, a paixão que o quadro transpira toma conta do estudante, que o esconde das visitas, que conversa com ele, ou com ela, a menina. O tipo de paixão que leva a desastres. Uma leitura prazerosa e enriquecedora, que recomendo.

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